O arranque da eletromobilidade no Brasil dependerá do esforço conjunto entre os setores elétrico e automotivo, com o suporte das instituições de pesquisa, desenvolvimento e inovação para apresentar soluções, que ajudem a baratear o custo – especialmente das baterias dos veículos -, permitam ampliar a infraestrutura para recarga, e apontem alternativas de modelos de negócio, que amparem o novo mercado. Esse foi o consenso do painel de debate promovido, esta semana, pelo Lactec, durante o Energy Solutions Show, em São Paulo. O evento ocorreu em paralelo ao Brasil Windpower, reunindo importantes players do mercado de energia e grandes consumidores.
O presidente do Lactec, Luiz Fernando Vianna, abriu o painel, apresentando o cenário atual da eletromobilidade no mundo, em termos de volume da frota de veículos elétricos e de iniciativas que alguns países vêm empreendendo para alavancar esse segmento. Também apresentou os números do Brasil e os projetos pioneiros realizados no país, que servirão de referência para o avanço tecnológico na área. Um deles é o da Eletrovia da Copel, implantada em parceria com o Lactec e a Itaipu Binacional. Foram instalados 12 eletropostos no trecho de aproximadamente 730 quilômetros da BR-277, que corta o estado, ligando Paranaguá, no Litoral, a Foz do Iguaçu, no extremo Oeste.
Ao falar dos desafios para o avanço da mobilidade elétrica, Vianna destacou a necessidade de o setor elétrico e as montadoras se prepararem para acompanhar as projeções de crescimento da frota de veículos. Ao mesmo tempo, o executivo entende que o Brasil dispõe de, pelo menos, dois mecanismos oportunos para viabilizar a transição para a eletromobilidade: a Chamada de P&D Estratégico nº 22/2018 da Aneel para Desenvolvimento de Soluções em Mobilidade Elétrica Eficiente e o Programa Rota 2030. . “O Lactec está fornecendo propostas a diversas concessionárias do setor elétrico, dentro da Chamada22, e nossa expectativa é de que, com essas soluções, possamos contribuir para a alavancagem da mobilidade elétrica no Brasil”, afirmou.
Vianna reforçou que a cooperação entre os setores de energia e automotivo e as instituições de P&D e inovação, como o Lactec, será imprescindível para que o Brasil possa acelerar sua transição para fontes renováveis no segmento da mobilidade. “Eu gostaria de deixar aqui a mensagem de que precisamos trabalhar juntos para ter projetos cada vez mais robustos, que desenvolvam nosso país e façam com que a mobilidade elétrica seja uma realidade aqui como já é em outros países.”
INVESTIMENTOS DA INDÚSTRIA
O diretor de Assuntos Externos e Governamentais da Nissan, Pedro Bentancourt, que participou do painel promovido pelo Lactec para expor a visão das montadoras sobre o tema mobilidade elétrica, concordou que a Chamada 22 da Aneel e o Rota 2030 podem ajudar no avanço da eletromobilidade e assegurou que o setor automotivo está disposto a investir em projetos de P&D e inovação tecnológica, por meio de um fundo que já teria, segundo ele, aproximadamente R$ 200 milhões – recurso que poderá ser direcionado, também, para desenvolvimento tecnológico dos veículos elétricos e híbridos.
Bentancourt lembrou que a Nissan começou a investir na fabricação de um modelo elétrico, em 2008, e atingiu até agora mais de 400 mil unidades vendidas no mundo. Ele adiantou que a montadora está desenvolvendo um modelo híbrido, com motor elétrico, cuja bateria é alimentada por um gerador à combustão, e deve ter autonomia de 32 km/litro. “O setor da mobilidade e da mobilidade baseada na eletricidade está passando por desafios significativos. Nós como empresa estamos tentando desenhar o futuro dessa nova mobilidade. O fato concreto é que nós temos que acelerar um pouco mais o que estamos fazendo porque, do contrário, a realidade vai nos atropelar”, avaliou, colocando como principais desafios a integração entre as distribuidoras de energia e infraestrutura para que o consumidor final possa abastecer os veículos.
Apesar dessas ponderações, as projeções do executivo em relação ao crescimento da frota de veículos elétricos no Brasil são otimistas. “Minha impressão, pelo que tenho observado em outros mercados, é que no momento em que as baterias atinjam um custo que seja equivalente à produção de um veículo à combustão interna – o que deve acontecer por volta de 2025 -, haverá uma mudança aceleradíssima. Eu me atreveria a afirmar que, em 2025, entre 4% e 5% da frota brasileira serão de veículos elétricos. E, talvez, por volta de 2030, 50% dos veículos novos sejam elétricos ou eletrificados.”, estimou Bentancourt.
DISRUPÇÃO
O pesquisador do Lactec, Carlos Bianchin, reforçou que o movimento mundial de transição para fontes mais sustentáveis de energia no segmento da mobilidade provocará transformações semelhantes as que ocorreram há cerca de 100 anos, nos Estados Unidos, quando as charretes passaram a ser substituídas pelos veículos motorizados, em razão do problema sanitário acarretado pelo grande volume de esterco dos cavalos nas ruas de Nova York. “Vivemos hoje o mesmo momento disruptivo. Vamos ter uma mudança e isso deverá se dar em um horizonte de uma década”, projetou.
Bianchin acredita que o principal desafio do setor automotivo será o de baratear o custo de industrialização das baterias, buscando a substituição das matérias-primas, como o cobalto, por insumos mais baratos e que garantam mais autonomia aos veículos elétricos. “O mercado vai precisar de novos supridores de baterias. Talvez, isso fique nas mãos das próprias montadoras ou, talvez, seja criado um novo modelo de negócio. Fato é que vai haver uma nova demanda”, apontou.
O pesquisador também concorda que a oferta de pontos de recarga, principalmente que cubram grandes distâncias, será necessária para alavancar a mobilidade elétrica no Brasil. Segundo ele, essa é uma das iniciativas com as quais instituições de P&D poderão contribuir para o desenvolvimento de soluções que supram essa demanda. Bianchin lembrou que o Lactec vem acumulando expertise em dispositivos que dão suporte à mobilidade elétrica. Já desenvolveu para a Light, concessionária do setor elétrico, um eletroposto de carga alternada, e vem atuando de forma efetiva no projeto da Eletrovia da Copel, buscando alternativas para baratear o custo, também, dos pontos de recarga, com soluções nacionais. “A ideia desse projeto não é só fazer a implantação dos eletropostos. É desenvolver, também, toda linha de carregador alternado e carregador de carga rápida”, afirmou.
Ainda de acordo com Bianchin, a expectativa é de que a Chamada 22 da Aneel ajude o Brasil a avançar bastante na transição para a eletromobilidade e amparar a instituição de novos marcos regulatórios, considerando que as propostas de projeto podem abranger tanto a estrutura de recarga como a de veículos elétricos ultraleves, leves ou pesados, além de novos modelos de negócio, inclusive, para a comercialização de energia.