Seis anos após o rompimento da barragem de Fundão, no município de Mariana (MG), as consequências do desastre podem ser compreendidas de forma mais completa. Em setembro, a equipe multidisciplinar formada por pesquisadores e consultores do Lactec divulgou a valoração econômica dos danos causados: um montante que pode variar de R$37,6 bilhões a R$60,6 bilhões.
Desde 2017, o Lactec é uma das empresas nomeadas pelo Ministério Público Federal (MPF) para diagnosticar os danos socioambientais do rompimento da barragem, que foram avaliados a partir de coletas, pesquisas e análise detalhada dos dados da região.
Ao todo, 96 danos foram diagnosticados e analisados, divididos em nove áreas: rejeitos; solo; flora; fauna; rios; mar; pescados; peixes e patrimônio cultural. A partir daí, foram avaliados no que diz respeito a sua área de abrangência, gravidade, possibilidade de reversão e se têm tendência a diminuir ou aumentar. Desses danos, 56% foram considerados pelos pesquisadores como gravíssimos e 54% são apenas parcialmente reversíveis — enquanto 18% não podem ser revertidos.
Para mensurar um valor de compensação para o que foi destruído no desastre, o coordenador do projeto pelo Lactec, Leonardo Bastos, explica que novos métodos tiveram que ser empregados. “Estamos falando do que foi com certeza o pior desastre de mineração no Brasil e, possivelmente, no mundo. Toda a metodologia que utilizamos é nova, porque o nosso país não tem um histórico no controle e diagnóstico de desastres com esta complexidade e abrangência”.
Para diagnosticar os danos socioambientais, foram realizadas comparações de dados reunidos pelos pesquisadores. A equipe reuniu levantamentos previamente realizados na área atingida pelo rompimento da barragem, como análises de qualidade de água e dados de diagnóstico ambiental. Desde 2017, esses dados são coletados novamente e sistematizados para fins de acompanhamento.
Estimando o inestimável
Diante da falta de pesquisas nacionais a respeito, a equipe de pesquisadores do Lactec foi aos Estados Unidos buscar a experiência do país na atuação em grandes desastres ambientais, tal como o vazamento de petróleo ocorrido no Golfo do México em 2010.
As metodologias empregadas nos estudos realizados pela National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) para avaliar desastres ambientais foram então incorporadas a métodos já empregados em avaliações de impacto ambiental e outros tipos de análises ambientais sistêmicas.
Para que a valoração econômica dos danos do desastre chegasse a um resultado que englobasse a maior gama possível dos danos analisados, foram aplicadas duas metodologias: o Método de Equivalência de Habitat e Recurso (MEHR) e a Valoração Contingente (VC). O MEHR mede os custos de ações de recuperação e compensações necessárias diante dos danos e considerou os seguintes habitats: vegetação, solos, água dos rios afetados, área marinha, peixes, aves escavadoras, patrimônio arqueológico e patrimônio material.
E, para além da destruição que pode ser quantificada em área coberta por rejeitos de minérios e hectares degradados ou quantidade de água afetada em metros cúbicos, identificada pelo método MEHR, o estudo considerou também em sua Valoração Contingente os danos ao patrimônio imaterial. “Tão importante como falar sobre o valor, é falar sobre o patrimônio histórico intangível que se perdeu. Como afirmar quanto vale a perda da realização da Festa da Padroeira de Bento Rodrigues ou quanto vale o rio para os Krenak?”, exemplifica o pesquisador Leonardo Bastos, referindo-se a um dos eventos mais tradicionais da região e a uma das comunidades indígenas afetadas pelo desastre.
A VC representa o valor que a sociedade atribui aos danos, o que é calculado a partir de pesquisas domiciliares e aplicação de questionários. Os habitats considerados são: vegetação, fauna terrestre e aquática, água dos rios afetados e patrimônios arqueológico, material e imaterial.
No fim do processo, os dois métodos de valoração, que fazem avaliações de diferentes perspectivas, foram combinados para que se chegasse ao valor do impacto dos danos do desastre de Mariana, que varia entre um valor mínimo de R$37,6 bilhões e máximo de R$60,6 bilhões.
O rompimento da barragem de Fundão, em Mariana
No dia 5 de novembro de 2015, a barragem de Fundão da Mineradora Samarco se rompeu, com uma enxurrada de lama e rejeitos de minério que se arrastou por cidades e vilarejos de Minas Gerais até o estado do Espírito Santo. Apesar da calamidade, o que se pode aprender com a análise do desastre traz mudanças importantes, como bases sólidas para a governança e prevenção de desastres tecnológicos, além do controle e mitigação de desastres naturais.
Segundo os dados compilados pelo Lactec, foram 1.551 hectares de terra afetados; quatro terras indígenas e mais de 40 municípios atingidos; 675 km de rios afetados; 11 toneladas de peixes mortos; mais de 1,4 milhões de pessoas impactadas e 44,5 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração que vazaram da barragem.